Pasquim: A revolução no jornalismo brasileiro (texto orginalmente publicado no jornal Minuano - 2006)
Nestes dias de espetacularização da corrupção e a política nacional servindo de “picadeiro” para políticos, falta à população um veículo de informação que busque ...
...através de um humor “anárquico” contextualizar e criticar o que está ocorrendo em nossa pátria de “chuteiras” (até na grande alegria do povo a corrupção deu mostra de sua força no campeonato brasileiro do ano passado)e é justamente nessas horas que lembramos com saudades do velho Pasquim.
Se Deus é brasileiro e se esse é o país do futuro, ou se esse não é um país sério, como afirmava o general francês De Gaulle, pouco importa! Todas as máximas ditas e reeditas serviam de piada para o Pasquim, que continha aliada à informação, um humor ferino e sagaz, daqueles que colocava o dedo na ferida sem medo de criar polêmica ou inimigos.
Lançado em 26 de julho de 1969, pelo jornalista gaúcho Tarso de Castro, o jornal seria uma das grandes forças contra a repressão política da ditadura militar nos anos 70.
Com uma tiragem inicial de 20 mil cópias (o jornal chegaria na metade da década de 70 a 200 mil cópias), o Pasquim era inovador em se tratando da imprensa da época, pois falava de assuntos até então tabus para o Brasil daqueles tempos, como divórcio, sexo, drogas, aborto, feminismo, etc. Formado por uma das melhores equipes jornalísticas da história da imprensa nacional, o Pasquim revolucionou o jornalismo brasileiro, imprimindo como marca principal, textos ousados e inteligentes, matérias alternativas e espaços para um humor ácido em sua crítica social.
Em plena era de repressão militar o Pasquim foi uma das vozes contra a ditadura. Um exemplo dessa força foi a prisão de todos os jornalistas do veículo em 1970. O governo que almejava terminar com o jornal, não imaginava que vários artistas e intelectuais se reunissem e mantivessem o jornal funcionando como colaboradores, entre eles estavam: Chico Buarque,Glauber Rocha, Norma Bengell, entre outros artistas e intelectuais.
O “Dream Team” do jornalismo nacional
Qualquer jornal gostaria de ter uma redação com a patota de jornalistas, artistas e intelectuais como a do Pasquim, afinal as mentes e expressões mais inteligentes e ousadas naqueles "anos de chumbo", escreviam para o jornal. Gente como: Tarso de Castro, Paulo Francis, Jaguar, Millôr Fernandes, Paulo Garcez, Sérgio Cabral, Luiz Carlos Maciel, Fortuna, e depois colaboradores de primeira como: Henfil, Ziraldo, Tárik de Souza, Ruy Castro, Fausto Wolff, entre muitos outros.
Por isso não tinha como o Pasquim não ser aclamado como ícone de um tempo, influenciando vários jornais alternativos, os chamados jornais nanicos, nas décadas seguintes, publicações que auxiliaram na crítica política e social principalmente no período de abertura e das Diretas Já em 1984.
O Fim do Pasquim
A grande força do jornal vinha de sua postura de crítico da realidade social daquele período de ditadura, pois nos anos 80 o jornal, que tinha uma excelente tiragem, começava a perder espaços para outros veículos de comunicação.
A queda nas vendagens foi tão intensa que na década de 80 o jornal já não despertava o mesmo interesse dos anos anteriores, perdendo espaço pra revistas como a do Chiclete com Banana, entre outras publicações.
O Pasquim encerrava sua história em 11 de fevereiro de 1991. Da equipe original só restara o desenhista Jaguar.
Tentando recuperar a magia dos velhos tempos, Ziraldo, em 2001, banca o relançamento do Pasquim, agora com o nome de Pasquim 21. O jornal volta a contar com bons jornalistas, e alguns antigos colaboradores, porém não conseguiu obter a mesma química dos velhos tempos, acabando definitivamente em 2004.
Henfil e o retrato em desenho dos brasileiros
Uma das grandes “cabeças” do Pasquim foi o cartunista Henrique de Souza Filho, o Henfil.
Nascido em 5 de fevereiro de 1944 e tendo falecido em 4 de janeiro de 1988, Henfil foi um dos grandes cartunistas e desenhistas do Brasil.
Após desistir do curso de sociologia e de ter participado de alguns jornais mineiros, vai para o Rio de Janeiro no final dos anos 60, quando começa a trabalhar para revistas como Realidade, Placar, Visão e o Cruzeiro. Em 1969 entra para o Pasquim e para o Jornal do Brasil obtendo grande destaque com personagens como Fradinhos, Zeferino e Graúna.
Dono de um estilo anárquico e altamente crítico, Henfil foi um daqueles gênios da raça que partem cedo deixando um imenso legado para a arte e a cultura de seu país.
Também foi jornalista e escritor, publicando livros e peças.
Um de seus livros mais interessante é o Diário de um Cucaracha (1977) que aborda o período em que Henfil exilou-se nos EUA para fugir da ditadura, lançar-se no mercado de quadrinhos do exterior e tratar a hemofilia (tanto ele quanto o irmão, o sociólogo Herbert de Sousa, o Betinho, contraíram AIDS após uma transfusão de sangue nos anos 80), descobrindo, “na pele”, o preconceito dos americanos para com os latinos.
Henfil passou três anos nos Estados Unidos e teve seus desenhos publicados apenas em revistas underground, pois os grandes jornais achavam seus cartoons “dementes”.
O livro é um achado e mostra bem o que resta aos “Cucarachas” (baratas) latino-americanos que se aventuram nos EUA: subemprego, crime, exploração e preconceito.
O livro pode ser encontrado em sebos e nas Bibliotecas da Urcamp e Dr Otávio Santos.
Outras Obras de Henfil
Hiroxima meu Amor, 1976.
Fradim de Libertação, 1984.
Dez em Humor, 1983.
Diretas Já, 1984.
Para saber mais:
Tarso de Castro: 75 kg de músculos e fúria, de Tom Cardoso. Editora Planeta, 280 páginas. Valor: R$ 37,50.
Tendo como título a frase de abertura dos textos que Tarso de Castro (1941-1991), publicava. O livro do jornalista Tom Cardoso é uma boa oportunidade para as novas gerações conhecerem um pouco sobre o jornalista gaúcho (natural de Passo Fundo) que fundou o Pasquim e viveu uma vida polêmica.
Conhecido pelo texto ácido e por suas polêmicas criadas, Castro misturava várias lendas criadas sobre a sua figura, com a habilidade ímpar de cultivar inimizades, como a que criou após sair do Pasquim com seu ex-colega de jornal Millôr Fernandes, nas palavras de Castro, um homem corroído pela inveja e pelo poder.
Boêmio de plantão e amigo de “feras” como Glauber Rocha, Vinicius de Moraes, etc, Tarso de Castro era de um tempo em que fazer jornalismo era gerar discussão e revolucionar através da palavra, enfim: bons e velhos tempos!
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